Iniciamos a terapia em uma clínica particular especializada em Transtorno do Espectro Autista (TEA). A primeira sessão foi longa, quase duas horas de atendimento e o profissional que nos atendeu realizou a anamnese (termo que se refere ao processo de coleta de informações sobre a história de saúde de um paciente, realizado por um profissional por meio de entrevista).
O atendimento ocorreu em uma sala ampla, cheia de brinquedos educativos e sensoriais. Enquanto nossa filha explorava aquele “mundo de possibilidades”, nós conversávamos e respondíamos a um tipo de questionário. O terapeuta era fonoaudiólogo e também professor. Ele nos orientou sobre a importância de participar das sessões terapêuticas, compreender as técnicas utilizadas e aplicá-las em nosso dia a dia. Disse, inclusive, algo que marcou: “Eu sou especialista em autismo, mas vocês são especialistas na filha de vocês.” Conversar com ele foi uma experiência muito rica e esclarecedora, que tirou muitas das dúvidas que tínhamos.
Saímos da clínica com o resultado da anamnese que foi autismo de moderado a leve (conforme a classificação utilizada na época), com um livro sobre transtornos globais do desenvolvimento e com um orçamento para a terapia recomendada ABA (Análise do Comportamento Aplicada), com carga mínima de 2 horas semanais, sendo que o ideal seria 10 horas por semana. Fomos atrás de orçamentos e, tanto nessa clínica quanto em outras que pesquisamos, o valor por hora de terapia era absurdamente alto para nossas condições financeiras na época.
Iniciamos com o mínimo de sessões possíveis, com a ajuda financeira dos nossos pais. No entanto, eu sentia que não seria suficiente. Ela já estava com quase quatro anos, e eu havia lido alguns estudos sobre a plasticidade cerebral, a capacidade do cérebro de se adaptar e mudar ao longo da vida, que é especialmente pronunciada e crucial nos primeiros cinco anos de vida.
Foi então que tomei uma decisão: parar de trabalhar fora, dar um tempo na minha carreira profissional e me dedicar integralmente às terapias e ao desenvolvimento da nossa menina.
Sempre fui o tipo de mãe educadora, daquelas que transformam a casa em um jardim de infância, que ensina musiquinhas com gestos, conta histórias, senta no chão e brinca com os filhos. Desde a minha primeira gravidez, sempre me interessei por temas relacionados ao desenvolvimento infantil. Agora, mais do que nunca, precisava aprofundar meus conhecimentos, desta vez focado no desenvolvimento de uma criança autista.
Lembro que, assim que tive minha primeira filha, assistia um programa de TV chamado Supernanny, um reality show educativo em que a especialista em terapia comportamental infantil, Cris Poli, visitava famílias com dificuldades na criação dos filhos. O objetivo era promover mudanças no comportamento das crianças e melhorar o convívio familiar por meio de uma educação firme, respeitosa e afetuosa. Eu e meu esposo assistíamos todas as semanas e colocamos muitas das técnicas em prática. Quando a mais nova nasceu, já tínhamos regras e rotinas bem estabelecidas. Bastaram algumas adaptações para atender às duas meninas, com idades e comportamentos diferentes.
Com a decisão de ser mãe em tempo integral, me dediquei às necessidades de cada uma. Para a mais velha, procurei atividades extracurriculares como balé e jazz, além de promover encontros com amigas para brincarem de bonecas e se vestirem de princesas. Para a mais nova, busquei todas as terapias possíveis, especialmente as gratuitas, na cidade onde morávamos. Encontrei o Centro Municipal de Educação Alternativa (Cemea) e a Associação de Paradesporto de Blumenau (Apesblu), onde pude matricular nossa autista em diversas atividades. Assim, ela frequentava o ensino regular todas as tardes e, nas manhãs, participava das terapias: estimulação essencial no Cemea, natação e ginástica artística na Apesblu, além de sessões de fonoaudiologia e musicoterapia com terapeutas particulares.
E assim fomos nos adaptando a essa nova rotina. Hoje, sinto com convicção que tomar a decisão de me dedicar “full time” à educação de nossas filhas foi o melhor caminho. Agradeço ao meu esposo e a minha família, que me apoiaram nessa importante escolha. Quanto à minha carreira, retomei quando percebi que era o momento ideal, e ao vê-las, hoje, crescendo e cada dia mais independentes e felizes, tenho a certeza de que fiz “A Escolha Certa”.