Nos últimos anos, a presença da tecnologia assistiva nas salas de aula deixou de ser uma promessa distante para se tornar parte concreta da rotina escolar. De softwares leitores de tela a pranchas de comunicação, passando por aplicativos de organização e dispositivos adaptados, esses recursos têm aberto portas para que educandos com deficiência possam acessar conteúdos, interagir e demonstrar seu potencial.
Mas, junto com o avanço, surge uma pergunta que provoca reflexão: quando a tecnologia é uma verdadeira aliada e quando corre o risco de se tornar uma muleta? Uma tecnologia assistiva cumpre seu papel de aliada quando: amplia a autonomia: permite que o estudante execute tarefas com menos dependência de terceiros; potencializa habilidades já existentes: reforça e valoriza capacidades, em vez de substituí-las; garante acesso equitativo ao currículo: elimina barreiras físicas, sensoriais ou cognitivas, possibilitando participação plena; além de se integrar de forma natural ao aprendizado: não é um “extra” isolado, mas parte do planejamento pedagógico.
Um exemplo positivo: um educando com baixa visão que utiliza um ampliador digital para acompanhar textos em tempo real. A tecnologia não faz o trabalho por ele; apenas cria as condições para que ele participe no mesmo ritmo dos colegas. O risco de a tecnologia virar muleta aparece quando o uso é:
- Superficial: adotado apenas como modismo ou vitrine, sem relação direta com a necessidade do estudante.
- Excessivamente dependente: o recurso substitui a ação do aluno, reduzindo suas oportunidades de desenvolver competências próprias.
- Descontextualizado: usado sem alinhamento com objetivos pedagógicos, funcionando mais como entretenimento do que como ferramenta de aprendizado.
Por exemplo, entregar a um estudante com dificuldade de escrita um software que redige textos automaticamente, mas sem trabalhar paralelamente a organização de ideias e a expressão própria, pode criar dependência e limitar o desenvolvimento.
Estratégias para uso saudável
- Avaliação individualizada: a escolha do recurso deve partir das necessidades reais do educando, não da novidade tecnológica.
- Formação docente contínua: professores precisam conhecer possibilidades e limites das ferramentas.
- Uso gradual e com objetivos claros: a tecnologia deve ser introduzida como ponte, não como destino final.
- Parceria com a família: orientar e envolver responsáveis no uso adequado fora da escola.
- Revisão periódica: avaliar se o recurso continua sendo adequado ou precisa de ajustes.
O papel da escola. Mais do que fornecer equipamentos, a escola deve criar uma cultura de inclusão consciente, em que a tecnologia assistiva seja meio e não fim. É preciso valorizar o protagonismo do estudante, para que cada avanço seja fruto da interação entre suas competências pessoais, o apoio pedagógico e, sim, a tecnologia mas sem que ela roube a cena.
Quando usada com propósito, a tecnologia assistiva não apenas compensa barreiras, mas amplia horizontes. Quando mal utilizada, pode disfarçar a exclusão e limitar o desenvolvimento. A diferença entre uma aliada e uma muleta está menos no dispositivo e mais na forma como nós, educadores, o integramos à aprendizagem.